Jogo Sujo, o mundo secreto da Fifa revelado por Andrew Jennings

Ele defende que, mais do que celebrar o evento, a população deve estar atenta aos desvios de recursos públicos para cobrar as autoridades.
Jornalista investigativo inglês alerta para esquemas sujos da Copa de 2014 e defende mais transparência na organização do esporte no Brasil
Repórter investigativo há mais de 30 anos, o jornalista inglês Andrew Jennings gastou anos desvendando como a Federação Internacional de Futebol (Fifa) funciona.
No livro “Jogo Sujo, o mundo secreto da Fifa: compra de votos e escândalo de ingressos”, publicado no Brasil pela editora “Panda”, ele apresenta o que apurou.
Para quem é a Copa do Mundo de 2014?

Trata-se de uma história de arrepiar sobre os bastidores da maior organização esportiva do mundo. O trabalho, resultado da análise de pilhas de documentos e incontáveis entrevistas, é um alerta meticuloso e detalhado sobre como a Copa em 2014 no Brasil pode ser utilizada para corrupção e tramas sujas.
 1 –  É preciso jornalismo investigativo na Copa?
O futebol pertence ao povo e os recursos que o senhor Ricardo Teixeira (presidente da Confederação Brasileira de Futebol e do Comitê Organizador da Copa do Mundo de 2014)  recebe são impostos pagos pelas pessoas. Não faz sentido a copa ficar na mão de uma organização privada. Além disso, o senhor Teixeira não inventou o Pelé, o Ronaldo. Esses atletas vêm do povo e o povo tem direito de saber o que acontece. Toda sociedade é mais saudável se houver transparência.
2 – Como podemos ter mais transparência na copa?
Podemos pedir ao senhor Teixeira que coloque todos os documentos sobre a Copa do Mundo na rede mundial de computadores. É só escanear tudo, todos os documentos, todos os salários, todos os bônus, todos os contratos. Aliás, como esses cavalheiros viajam? Na parte de trás dos aviões como nós? Eles nem sabem que existe esta parte no avião. Na verdade, Ricardo Teixeira nem sabe como é viajar desta maneira porque só viaja em jatos privados. Nós temos que trazê-los de volta para terra.
3 – Há jornalistas que se comprometem com acordos comerciais e não fazem perguntas. Que pensa disso?
Quem é um jornalista, tem um bom coração e se preocupa em entender como a sociedade funciona, precisa fazer perguntas. É preciso levantar a mão e questionar: “Desculpe, eu pago impostos, porque estamos construindo este estádio novo?“
4 – Em 2006, Teixeira dizia que a copa seria bancada pela iniciativa privada. Até agora, 98% dos investimentos previstos são verbas públicas. Como vê isso?
Eles mentem. Pessoas como Ricardo Teixeira tentam fazer os brasileiros de trouxas. Ele está consciente da paixão do povo pelos jogos, consciente de que existe preocupação do Brasil em que o evento não seja um desastre, então diz desculpem, mas vocês vão ter que pagar taxas. Ele nunca vai pedir para as pessoas pensarem sobre isso, mas é preciso pensar. O Brasil não precisa da Copa do Mundo para ser reconhecido. Nas últimas décadas o País tem sido visto cada vez mais como independente e importante e não é pelo o que Romário ou Ronaldo fizeram.
5 – Como vê Teixeira como coordenador da copa?
Se ele for mesmo o responsável pela copa sabemos os desastres que virão. O dinheiro desaparecerá e não teremos os estádios prontos, os aeroportos, os transportes, a infraestrutura. Eles ficarão com o dinheiro, mas não com a responsabilidade. E, no fim, em vez de dizerem que o Brasil é maravilhoso, os visitantes farão críticas e dirão que os brasileiros são preguiçosos. 
6 – A copa é sempre organizada com verbas públicas?
A exceção talvez seja a da Alemanha, que tem uma sociedade rica e já tinha a maioria dos estádios e uma rede de transportes muito boa. Mas em geral é assim. Na África do Sul, meu Deus, como eles foram ludibriados por esses criminosos.
7 – Mas não há retorno financeiro para o país-sede?
É como um estupro. Eles dizem que haverá retorno, que tudo será pago, fazem promessas bonitas e os países cedem. Depois de se aproveitar, vão embora deixando estádios que não eram necessários e gastos que poderiam ser utilizados em investimentos sociais. Não escrevem e nem telefonam.
8 – Qual seria a solução?
As pessoas que ganham dinheiro poderiam pagar pela competição. Olhe os lucros da televisão, olhe o lucro do marketing gerado com a copa. Esse é um dinheiro deixado para o país? Será mesmo? E existe a necessidade de mais estádios? Ou será que quem vai ganhar não poderia  bancá-los?
9 – O futebol não é um negócio privado então?
Como é isso? Futebol é privado, mas temos políticos apoiando com verbas públicas o senhor Teixeira? Não. As pessoas precisam entender que o senhor Teixeira controla um grande número de políticos e de clubes grandes. Isso é revoltante. Esse tipo de relação precisa acabar. As pessoas têm que ser livres para fazer suas próprias decisões e participar. Futebol não é um negócio privado, é algo público.
10 – A maioria dos dirigentes de futebol permanece no poder por muito tempo. O que pensa disso?
Vejamos o caso de Joseph Blatter (presidente da Fifa). Ele é presidente porque 186 homens votaram nele. Não foram as pessoas que gostam de futebol. Eu não votei, você não votou. São esquemas de poder e é preciso bons repórteres para desvendá-los. Contem as histórias, publiquem na internet, vamos discutir isso. A copa é do povo, não do Ricardo Teixeira. É preciso que as pessoas tenham acesso ao conhecimento para discutir.
Por Daniel Santini - daniel.santini@folhauniversal.com.br

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